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quarta-feira, 14 de maio de 2014

Em "O Passado", Asghard Farhadi levanta antecedentes dos personagens sem "flash backs"

Mais do que uma simples história, O Passado de Asghard Farhadi é um ensaio sobre a memória, a consciência moral e a própria linguagem do cinema. Ao contrário do seu trabalho anterior -- A Separação, premiado com o Oscar, que operava na urgência do presente, se debruçando para as múltiplas possibilidades do futuro. Enquanto A Separação se desenrolava à beira de um rompimento familiar prestes a ocorrer ainda no Iran, O Passado se passa com parte de uma família já vivendo na França.
O filme se inicia com o marido voltando a Paris para oficializar o seu divórcio, porque a mulher que lá ficara com as filhas precisa se casar novamente. Ela é interpretada pela fotogênica e talentosa Berenice Bejo, esposa do diretor Michel Hazanavicius, com quem tinha feito o premiado O Artista. Meio que sem querer, esse quase ex-marido acaba descobrindo fatos extremante constrangedores a respeito do novo relacionamento da mulher.
A essência estrutural do roteiro é a opção por evitar o flash back. De modo que tudo o que tinha acontecido antes do início do filme precisa ser revelado, debatido e julgado nas cenas que passam naquele curto período em que o divórcio é assinado. Em outras palavras, o passado só pode se manifestar no presente, o que desafia a habilidade narrativa do diretor, mas amplia dramaticamente a sensação de vida real vibrando de verdade diante de nós. O Passado: outra grande obra de Asghard Farhadi, o lado mais vivo do cinema iraniano.

O PASSADO
Irã, França, 131min, 12 anos
estreia 08 05 2014
gênero drama/ família
Direção Asghard Farhadi
Distribuidor Califórnia Filmes
Com Bérénice Bejo, Tahar Rahim e Ali Mosaffa
COTAÇÃO
* * *
Ó T I M O

terça-feira, 29 de abril de 2014

A partir do dia 05 de maio de 2014, o Programa Cinema Falado retorna para a Rádio Cultura FM de São Paulo, com comentários diários ao longo do Rádio Metrópole e da Tarde Cultura. A gente se encontra por lá!

"Getúlio" dirigido por João Jardim: um filme à altura do personagem central.

Lançado no dia primeiro de maio, em homenagem àquele que criou a legislação trabalhista no Brasil, o filme Getúlio – dirigido por João Jardim, até aqui mais conhecido como um documentarista de talento (Janela da Alma – 2001). O enredo focaliza as três semanas que separam o atentado a Carlos Lacerda e a madrugada em que ele se suicidou. Mais do que um drama histórico, porém, o filme adquire a estatura de uma tragédia. E uma tragédia de suspense. Todos nós sabemos de que forma ele morreu, mas quando finalmente soa o tiro do suicídio, ocorre um alívio com o fim da tensão que vinha se acumulando desde o inicio, até atingir um nível insuportável. 
Ou seja, é perfeita a identificação entre o público e o personagem em desespero do presidente, interpretado com o máximo de empatia e verdade por Tony Ramos. Em seus momentos derradeiros, há um eco de Julio Cesar, como se ele exclamasse um “até tu Brutus” coletivo, enquanto que vai descobrindo as traições que parentes, amigos e até o seu guarda costas pessoal vinham praticando. O restante do numeroso elenco também não falha – escolhido provavelmente por Carla Camurati, a produtora executiva. A par do tipo físico adequado, quase todos os intérpretes escolhidos funcionam adequadamente diante das lentes cirúrgicas de Walter Carvalho. Destacam-se Alexandre Borges (Carlos Lacerda) e Drica Moraes (Alzira Vargas). O bom gosto e o bom humor de Carla Camurati, aliás, devem ter se associado para determinar escolhas preciosas, como o português Fernando Luís, para Benjamim Vargas, Marcelo Medici para Lutero Vargas e Clarisse Abujamra para Ivete Vargas. 

Mais que uma caracterização precisa, na aparência e nos diálogos de cada figura histórica, o roteiro do diretor e de George Moura (Gonzaga de pai pra filho - 2012)  produz emoção de verdade – desde indignação, pelo mar de lama que se revela, até a angústia amplificada pela soturna arquitetura do Palácio do Catete, que fica parecendo um mausoléu sob a luz de Walter Carvalho. No entanto, o que nos atinge mais de perto, a garantir a universalidade da narrativa, são as delicadas manifestações de carinho entre o caudilho e a filha Alzira – além das inevitáveis comparações com o mundo contemporâneo. Mesmo longe do planalto central e de costas para a praia o mar de lama já se achava agitado. 
GETÚLIO
Direção João Jardim
estreia 01 05 2014
Brasil 2013 – 100 min. – 12 anos
gênero docudrama
Distribuição Copacabana filmes 
com Tony Ramos, Drica Moraes, Alexandre Borges
COTAÇÃO
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ÓTIMO

quarta-feira, 26 de março de 2014

Em DVD um clássico do western: "Juramento de Vingança" (Major Dundee) de Sam Peckimpah

Lançado em DVD pela Versátil , "Juramento de Vingança", uma obra de Sam Peckimpah com o título original de Major Dundee, que é o nome do personagem central, interpretado por Charlton Heston. Foi feito em 1968,  época em que o Cinema Novo se iniciava no Brasil e a Nouvelle Vague aparecia na Europa. Mas o filme tem a estatura de um clássico, com todosos elementos que faziam a grandiosidade do gênero. O tema é uma luta justa contra um bando de índios apaches que, na verdade eram bandidos, ou seja, algo parecido com os nossos cangaceiros, que praticavam barbaridades na fronteira com o México. Só que, para complicar tudo, a Guerra da Secessão estava no final e o Major do título foi obrigado a recrutar prisioneiros confederados, ou seja, sulistas rebeldes, para enfrentar aqueles bandoleiros que se reuniam num grande grupo.

Outra complicação era a convivência desses soldados derrotados com ex-escravos que pertenciam ao exército da União. Os dramas mais pesados, porém, se situam no interior do suposto herói e se referem à sua desmedida ambição política, ao seu alcoolismo e à queda pelo sexo oposto. Naquele mesmo ano, na Itália, Roberto Rosselini, então dedicado ao docudrama histórico, pintava o quadro de outro herói militar, que viveu no tempo do Major Dundee. Era o lider Giuseppe Garibaldi que, sob as lentes de Rosselini ficava parecendo um santo. Se os dois filmes forem comparados, os que sempre preferem o cinema europeu ao americano ficariam surpresos ao verificar que o de Sam Peckimpha é mais realista. 

segunda-feira, 24 de março de 2014

Em cartaz "Rio 2", animação americana do carioca Carlos Saldanha e sua arara azul

Nesta semana estreia “Rio 2”, novo episódio das aventuras criadas pelo animador brasileiro Carlos Saldanha para a Fox de Hollywood, com um casal de araras azuis que vive no Rio de Janeiro. Apesar da sua espécie se achar em extinção, eles já têm tres filhotes e formam uma família. Portanto, o diretor Carlos Saldanha se encontra de novo em seu ambiente preferido, não fosse ele um dos criadores de “A Era do Gelo” – protagonizada por uma família de animais pré-históricos... já extintos. Desta vez, a odisséia desses pássaros de cor azul anil prova que eles têm coração verde e amarelo, porque voam até a Amazônia, para encontrar o resto dos seus parentes. E com eles vão outros pássaros que simbolizam o país: um canarinho, um pica-pau e um tucano. 
Lá chegando, encontram duas tribos rivais de araras: as azuis e as vermelhas, numa curiosa referência à festa amazônica de Parintins. E tambem o grande vilão da história que é um madeireiro empenhado em desmatar a selva. Ao som de Sergio Mendes e outros músicoas brasileiros, como Milton Nascimento e os Barbatuques, as imagens iniciais no reveillon do Rio de Janeiro são deslumbrantes, assim como as da floresta, mesmo que o registro dos cenários seja desenvolvido num desenho quase realista. O filme tem um número maior de personagens, tamas mais complexas e mais música que o anterior, o que não permite nenhum momento de tédio. É como se Saldanha reunisse vários gêneros de comédia, como a sátira e a paródia, num roteiro que lembra a agitação das melhores chanchadas dos anos de 1950.
Rio 2
estreia 27 03 2014 
gênero animação/ comédia
distribuição Fox

Direção Carlos Saldanha

COTAÇÃO
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Ó T I M O

terça-feira, 18 de março de 2014

"O Grande Herói" e "Alemão", diferentes um do outro, mas com alguma coisa em comum.

Nesta 5ª feira será lançado o filme americano “O Grande Herói”, produzido e protagonizado por Mark Whalberg, um docudrama sobre a vida real de Marcus Luttrell que, em 2005, foi escalado para integrar um grupo de 4 soldados da Marinha com a missão se matar um líder da Al Qaeda. Para isso, eles precisavam “apenas” desembarcar de helicóptero numa montanha do Afganistão, caminhar até uma aldeia lotada com centenas de talibãs, executar o terrorista e voltar pra casa. Só que, logo de cara uma cabra denunciou a presença dos americanos e a heroica turminha viu-se vivendo uma situação parecida com aquela antológica piada de José Vasconcelos na qual o caubói John Wayne, ao se encontrar cercado por milhares de índios, não teve alternativa senão tornar-se ele próprio um índio. 
Estou mencionando este filme para falar de outro: o brasileiro “Alemão” de José Belmonte, em que Caio Blat, Milhem Cortaz, Otávio Müller e Gabriel Braga Nunes são policiais infiltrados no morro do Alemão no dia em que aquela favela foi invadida pela polícia. Trata-se de outra situação equivalente que o diretor de “Se Nada mais der Certo” (2008) desenvolve com extrema competência. A perseguição de moto pelas vielas do morro, por exemplo, já revela o seu domínio sobre a ambientação e o ritmo da história. A maior parte deste drama, porém, se desenrola dentro do esconderijo onde os policiais tentavam se proteger e isso acaba trasformando a narrativa numa espécie de peça teatral, com a densidade de “Entre Quatro Paredes” de Jean Paul Sartre.
Sem a estatura da marca “Tropa de Elite” criada por José Padilha, este “Alemão” de José Belmonte marca o abandono pelo diretor daquele tom positivo e esperançoso que vimos em “Se Nada mais der Certo”. O roteiro, no entanto, mantem a proposta de cruzar as linhas da trama, ou seja, de entrelaçar as trajetórias abordadas pelo filme, isto é, misturar os problemas individuais com as questões sociais e políticas: os romances secretos e as articulações palacianas. Antônio Fagundes interpreta o delegado, provavelmente fictício, que teria concebido o projeto inicial de ocupar de surpresa o complexo do Alemão em novembro de 2010. Numa cena, ele mostra a sua contrariedade de ter o seu plano incorporado pelo governo, sem o cuidado que merecia. 
De outro lado, o chefe do tráfico vivido por Cauã Reymond precisa fingir que não se abala ao saber que a mãe do seu filho se acha presa, por acaso, no mesmo esconderijo em que um grupo de policiais infiltrados no morro como informantes se acha entocado. Essa miniatura da vida humana nas cidades é desenhada pelo filme como uma antecipação do inferno, em todos se colocam contra todos, mesmo sem perder a capacidade de manifestar afetos, medos e simpatias. Um universo de perigo e violência do qual não existe fuga possível, nem para o matagal que cerca o morro do Alemão e que, pacientemente, espera o dia em que será trocado por mais algumas centenas de barracos. O diretor nos revela que o tema do filme é o sacrifício dos homens, mas, poderíamos acrescentar que é também o da vida sobre a terra.
ALEMÃO 

Brasil, 2013, 109 min, 16 anos
gênero docudrama/ policial
Distribuição Downtown Filmes
Direção José Eduardo Belmonte
Com Caio Blat, Milhem Cortaz, Otávio Müller, 
Gabriel Braga Nunes, Antonio Fagundes, Cauã Reymond
COTAÇÃO
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B O M

domingo, 2 de março de 2014

Mesmo que ganhe o "12 Anos de Escravidão", meu favorito para o Oscar é "Gravidade".

Há semanas na capa da nossa página no Facebook, "Gravidade" é o meu favorito para a premiação de hoje, ainda que "12 Anos de Escravidão" tenha mais condições de sair vencedor.   Apesar de ambientado no espaço “Gravidade” não é uma obra de SF. Seus protagonistas uma cientista vivida por Sandra Bullock e um astronauta na pele de George Clooney se acham numa nave em órbita sobre a Terra para trabalhar um telescópio, quando um acidente destrói o veículo e eles ficam literalmente com a roupa do corpo, apenas com o oxigênio que estava em seus reservatórios individuais. Sem, comunicação com a NASA, o único jeito seria alcançar uma estação chinesa abandonada naquela órbita. Diferentemente de “Os filhos da Esperança”, um de seus trabalhos anteriores, este não é SF porque o tratamento dado pelo autor e diretor mexicano Alfonso Cuaron é totalmente realista.
Entre seus principais temas estão a fraqueza e a força do ser humano quando se acha fora do seu habitat natural. A fragilidade física, orgânica, é evidente naquele ambiente sem ar, sem som nem gravidade. Mas quais seriam recursos mentais disponíveis? Sem entrar em detalhes que poderiam estragar a surpresa do ouvinte, podemos adiantar que eles se encontram da área do controle emocional, por meio da respiração e do distanciamento entre a mente e as ocupações corriqueiras e automatizadas da atividade cerebral. Uma indicação de que essa postura do roteiro é consciente está na fala de um personagem, comentando a beleza do por do sol sobre o rio Ganges, que banha a Índia, pátria do Yoga que, por sua vez, consiste num conhecimento milenar fundamentado nas conexões entre corpo e mente.

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Tarja preta sobre o azul: não se trata de um hai-kai, mas de um alerta.

Uma bizarra discussão vem agitando os bastidores do mercado de cinema. Tudo começou com uma nota oficial da empresa Imovision detentora dos direitos do filme “Azul é a Cor Mais Quente”.
“...procuramos a empresa brasileira Sonopress, para replicar esse título em Blu-ray, mas ela se recusou e ainda alegou que nenhuma outra empresa faria o serviço. Contatamos então a SONY DADC, que também se recusou a produzir o Blu-ray do filme, devido às cenas de sexo. Portanto, o filme, vencedor do Festival de Cannes, poderá ser reproduzido apenas em DVD”. Segundo o presidente da distribuidora Imovision, “Não é um filme pornô. Na França o filme recebeu classificação indicativa de 12 anos”. De fato, não existe oficialmente no Brasil filme pornô em Blu Ray. O jornalista Allyson Oliveira informa que a Sony não permite que as replicadoras fabriquem filmes pornôs. Se fabricarem, perdem a licença. Por isso, ele conclui que a Imovision não esteja tentando criar um factoide para promover o filme. É possível que as replicadoras, vendo trechos do filme e sem informações completas possam ter tachado o filme de pornô. Mas alguns comentaristas acreditam que por trás disso haja um problema relativo á negociação de preço. A maioria considera que se trata apenas de uma decisão comercial, não de homofobia, censura ou intolerância, como pode parecer pela leitura da nota oficial. Se as cenas de sexo fossem entre homem e mulher, o filme seria vetado do mesmo jeito. 


Foi-se mais um ícone da cultura popular brasileira: Virginia Lane

Quase ninguém comentou, mas no dia 10 de fevereiro se foi Virginia Lane, apelidada de "a vedete do Brasil", estrela absoluta do teatro de revista e das chanchadas. Durante 15 anos, ela foi amante de Getúlio Vargas e, dois anos antes de falecer, com 93 anos, declarou que estava na cama com o presidente Vargas na noite em que ele morreu, segundo ela assassinado e não por meio de suicídio, como ficou registrado na história. Em função disso, o jornalista Élio Gaspari criou a expressão "síndrome de Virginia Lane", para se referir às hipóteses de assassinatos de presidentes. Mas o motivo pelo qual ela talvez preferisse ser lembrada era a sua participação contínua, entre os anos de 1940 e 1960, em dois fenômenos culturais de grande ressonância popular naquele período. Falo do teatro de revista, que valia como a única tribuna à disposição de músicos e comediantes para se comunicar com o público das grandes cidades, antes das "chanchadas". Assim eram rotulados os filmes cômicos e musicais daquela época, até pouco tempo estigmatizados como artisticamente inferiores pelos críticos e comentaristas e que, agora, vem merecendo uma necessária releitura por parte de historiadores e especialistas. Para ilustrar esse comentário escolhi o seu maior sucesso do rádio e do disco que foi "Sassaricando", tal como foi filmado pelo grande Moacyr Fenelon em "Tudo Azul" (1950), um dos filmes nacionais mais importantes daquele tempo.

Com "Balada de um Homem Comum", os Coen ganham o Grande Prêmio do Juri em Cannes

Os irmãos Coen formam uma já tradicional dupla de cineastas que escrevem e dirigem filmes em parceria e podem ser vistos como cronistas de seu tempo. Digo do tempo atual e dos tempos em que eles viveram, sempre com um agudo e refinado senso de observação. Os quatro Oscars por eles conquistados ao longo de uma carreira iniciada nos anos de 1980 nem chegam a fazer justiça à incomum capacidade literária, humorística e dramática com que eles detectam os pontos nevrálgicos de qualquer situação. Entre seus temas favoritos, salientam-se a vida íntima de criminosos e policiais – como em “Fargo” (1996) – e os meandros da cultura judaica – como em “Um Homem Sério” (2010). 
Desta vez, em “Inside Llewyn Davis – Balada de um Homem Comum”, eles focalizam a música popular americana na década de 1960, especificamente a onda das canções folk sofisticadas que estava se formando no Greenwich Village em Nova York, da qual Joan Baez e Pete Seeger faziam parte. Inspirados em um cantor e compositor de verdade, que chegou a fazer algum sucesso um pouco antes de Bob Dylan chamado Dave Van Ronk (1936 – 2002), eles criam a figura patética de Llewyn Davis: um jovem artista que apesar de talentoso e sensível se acha fascinado pelo fracasso.
No elenco, as participações sempre irretocáveis de Carey Mulligan, Murray Abraham e John Goodman, contracenando com o dublê de músico e ator coadjuvante Oscar Isaac, no papel central. Carregando junto com o violão toda a amargura daquela época, o personagem faz de si mesmo o seu principal antagonista. Como uma deferência aos cinéfilos, o roteiro elabora uma acrobacia de linguagem que só acontece na última cena e que, por isso, não podemos revelar.

INSIDE LLEWYN DAVIS 
– BALADA DE UM HOMEM COMUM 
(Inside Llewyn Davis)
EUA, 2013, 104 min, 12 anos
estreia 2102 2014
gênero comédia/ historia
Distribuição Paris filmes
Direção Ethan Coen, Joel Coen
Com Oscar Isaac, Carey Mulligan,
Murray Abraham e John Goodman
COTAÇÃO
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Ó T I M O

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

"Ela" é o título da obra do ex-alternativo Spike Jonze, que concorre a cinco Oscars

A personagem do título não tem nome. Não passa de um pronome, que é feminino somente porque assim escolheu o protagonista do filme e proprietário do computador, ao nele instalar um sistema operacional de última geração, que obedece a comandos de voz. O diretor Spike Jonze (“Onde Vivem os Monstros”, 2009) situou esta trama em Los Angeles num futuro próximo e plausível, no qual a tecnologia da informação permitiria que o programa possuísse não apenas uma voz igual à de Scarlett Johansson (“O grande Truque”, 2006), mas também a alma de uma mulher. 
Em “Ruby Sparks: a namorada perfeita” (2012) o escritor Paul Dano se apaixonava por uma personagem que ele criou. Em “A Garota Ideal” (2009) o solteirão Ryan Gosling se casava com uma boneca inflável. Em “A Mulher Invisível” (2009), somente Selton Mello enxergava a namorada que ele mesmo tinha inventado. Em “Ela”, porém, Joaquin Phoenix (“O Mestre”, 2012) vive um caso de amor de verdade, com uma inteligência artificial e chega até a fazer sexo com ela.
A temática do filme, ou melhor, um dos assuntos que ela aborda é o do crescente isolamento a que os indivíduos vêm se acostumando. Por sua vez, a inteligência cinematográfica de Spike Jonze o leva a parodiar os filmes de ficção científica e aproveitar as oportunidades cômicas que essa melancólica parábola da solidão humana oferece – como o videogame interferindo nas conversas com o arquétipo feminino preso no computador.
Como vemos, a sofisticação que marca a comicidade de Spike Jonze não é para qualquer espectador. Por exemplo, o personagem de Joaquin Phoenix sente ciúmes da amada, encantada com outro sistema operacional que assumira a personalidade do filósofo Alan Watts – um dos divulgadores do budismo no ocidente e que, nos anos de 1960, pregava a “expansão da consciência” – justamente o oposto do que vem fazendo o namorado. 
ELA 

Her 
EUA, 2013, 126 min, 14 anos
estreia 14 02 2014  
gênero comédia/ fantasia
Direção Spike Jonze
Distribuição Sony Pictures
Com Joaquin Phoenix, Scarlett Johansson, Amy Adams
COTAÇÃO
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Ó T I M O

"Trapaça" de David O. Russell é um ponto alto da comédia americana no cinema.

Em “Trapaça”, o diretor e roteirista David O. Russell comprovou o seu prestígio com um dos grandes nomes da comédia no cinema americano. Há pouco tempo vimos o drama “O Vencedor” (2010), que rendeu Oscars para Christian Bale e para Melissa Leo. Depois disso, ele lançou a surpreendente comédia “O Lado Bom da Vida” (2012), que trouxe um Oscar para Jennifer Lawrence. Recomendamos, no entanto, que se recorra a uma locadora de DVDs para ver um de seus melhores e mais ousados trabalho recentes e que, apesar disso, não foi lançado nos cinemas. Trata-se de “Huckabees: A Vida é Uma Comédia” (2004) com um elenco superestrelado incluindo Dustin Hoffman, Lili Tomlin, Jude Law, Naomi Watts e Isabelle Huppert. 
Desta vez, em “Trapaça”, ele elege como tema o escândalo conhecido como Abscam, ocorrido o final da década de 1970, em que um policial disfarçado de sheik árabe oferecia suborno a um grupo de políticos, com a ajuda de um vigarista condenado e constrangido a colaborar com o FBI. Esse escroque é o papel de Christian Bale que, aliás, Robert de Niro não reconheceu ao vê-lo entrar no set de filmagem, com uma peruca ridícula e quase 20 quilos acima do peso. 
Ele que tinha emagrecido mais de 30 para “O Vencedor”, contraiu uma hérnia de disco graças a esse efeito sanfona. O esforço, porém, valeu para enriquecer a sua caracterização e enfatizar a química com a parceira de golpes e malandragens, interpretada com maestria por Amy Adams (“Encantada”, 2007) e com a própria esposa, numa esfuziante interpretação de Jennifer Lawrence (“Jogos Vorazes”, 2012).
Esse trio sustenta com galhardia toda a comicidade e o colorido dos diálogos e das peripécias em que a dupla se envolve. Por sua vez, Jeremy Renner (“Guerra ao Terror”, 2008) faz um daqueles vários políticos grampeados na época por corrupção, inspirando-se na figura real de um prefeito de New Jersey que foi para a cadeia e morreu no ano passado, portanto, poucos meses antes do lançamento de “Trapaça”. Na esteira de uma temática que era a predileta do célebre Orson Welles (“Verdades e Mentiras”, 1973) sempre fascinado por falsários, imitadores e ilusionistas, o filme gira em torno das ideias de ilusão e falsidade. 
O casal de protagonistas, aliás, também vendia quadros falsos, obedecendo à máxima de que “as pessoas enxergam nas coisas aquilo que elas querem ver”. E para Russel talvez seja esse o dado essencial para explicar o encantamento produzido pelas obras de arte. Para demonstrar o quanto o diretor David Russel é detalhista, esses personagens são fanáticos por um álbum de jazz chamado “Duke Ellington Live at Newport”, que é um falso disco ao vivo. Na verdade, esse LP foi gravado num festival, mas Ellington não aprovou a qualidade do resultado e regravou a maioria das faixas em estúdio. Era, portanto um artista falsificando a sua própria obra, para vendê-la aos seus milhares de fãs, que nunca deixaram de admirá-lo por causa disso. Ou seja, um caso de refinada enganação em massa, que Orson Welles adoraria filmar.

TRAPAÇA 
American Hustle 
EUA, 2013, 138 min, 14 anos,
estreia 05 02 2014

gênero comédia/ policial/ história

Distribuição Sony Pictures
Direção David O. Russell
Com Christian Bale, Bradley Cooper, Amy Adams, Jeremy Renner

COTAÇÃO
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Ó T I M O

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

O título de "Quando eu Era Vivo" levanta a questão: qual seria o sujeito dessa frase?

Falando de “Quando eu Era Vivo”, não fosse a atuação correta do veterano Antonio Fagundes, junto com a beleza de Sandy, o cinema brasileiro poderia pedir emprestado esse título para fazer dele o seu mote atual. De fato, houve época em que os filmes nacionais tinham vitalidade, principalmente porque eram produzidos com dinheiro do próprio produtor, que neles apostava o patrimônio particular. Não eram natimortos como muitos dos recentes que, antes mesmo de estrear, já estão pagos com dinheiro público dos incentivos fiscais. Nem precisam mais de bilheteria, como era regra no tempo de Oscarito e Grande Otelo. Este “Quando eu Era Vivo” é dirigido com empenho por Marco Dutra, cujo trabalho de roteirista em “Meu País” (de Andre Ristum, 2011) chamou atenção pela profundidade psicológica e social. Já “Trabalhar Cansa” (2011) que ele co-dirigiu com Juliana Rojas foi recebido com palmas por alguns críticos (a maioria deles) e bocejos por outros (comigo nesse grupo). A partir de um livro de Lourenço Mutarelli, "A Arte de Produzir Efeito Sem Causa", o roteiro elabora uma letárgica experiência no gênero de horror protagonizada por Marat Descartes, no papel de um homem maduro que, ao se separar da esposa volta a morar com o pai. A narrativa é minimalista, contrastando uma trovejante trilha sonora que espanta o sono. Leva uma hora de conversas banais, vômitos e ataques epiléticos para enunciar o tema, ou seja, a casa é assombrada pelo espírito da mãe morta. Original, não?

QUANDO EU ERA VIVO

Brasil, 2013, 108 min, 12 anos
estreia 31 01 2014
gênero horror 

Distribuição Vitrine Filmes

Direção  Marco Dutra 
Com Marat Descartes, Antonio Fagundes, Sandy
COTAÇÃO
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REGULAR

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Dois de fevereiro: no mar, festa para Iemanjá; na terra, pranto para Eduardo Coutinho

Enquanto os devotos de Iemanjá festejavam a Rainha do Mar, um grande homem de cinema deixava o mundo dos vivos. É até possível que parte das flores, das palmas e do perfume das oferendas tenha embalado a passagem do criador de filmes como “Santo Forte” e “Cabra Marcado pra Morrer”. Mais útil, porém, do que comentar a morte do documentarista Eduardo Coutinho é falar da vida e da importância deste artista, deste operário do gênero que ele re-inventou durante sua carreira – felizmente vitoriosa e merecedora do reconhecimento geral que ele conquistou, por parte do público, dos estudiosos e dos críticos, de todas as tendências. Ele mesmo, aliás, era um teórico – assim como foram os mestres, como Eisenstein, Hitchcock, Rosselini e Humberto Mauro. Coutinho pertencia a esse panteão muito restrito dos realizadores que, além de criar, pensavam o cinema, ou seja, desenvolviam análises e conceitos sobre a sua arte. Como é o caso das suas reflexões sobre as fronteiras entre o documentário, a ficção e a chamada vida real, especialmente em obras seminais como “Jogo de Cena” (foto acima). O trabalho de Eduardo Coutinho colocou esse gênero de filme no centro da atividade cultural brasileira e, por isso, ele entrou para a nossa história. Mas é importante que a multidão de seus seguidores tome os 20 filmes que ele dirigiu como marcos, ou paradigmas, e não como padrões a serem imitados. Que seu método de trabalho seja um exemplo para todos nós, mas que seu estilo não se transforme em maneirismo. Amém...

domingo, 2 de fevereiro de 2014

Lançados em DVD três clássicos japoneses dos anos 40, 50, e 60 sobe o tema dos 47 Ronins.

Um dos mais marcantes filmes lançados nesta semana é o americano "47 Ronins", baseado num episódio de 1701 no Japão, que foi o acontecimento histórico mais emblemático do “bushidô”, ou seja, o código de honra dos samurais, em que destacam valores como coragem e lealdade. Um senhor feudal foi injustamente condenado a cometer o arakiri e, então, 47 de seus samurais resolveram se vingar. Esse incidente está ligado ao aumento do poder centralizador dos xoguns contra os senhores locais e a diminuição do prestígio dos samurais. (ilustração de época acima
O acontecimento deu origem a muitos filmes e séries de TV. Agora, junto com a versão hollywoodiana, com Keanu Reeves, que aposta em elementos sobrenaturais da mitologia japonesa, a Versátil lançou uma caixa com três clássicos japoneses sobre o mesmo tema. Apesar de uma estrutura básica comum, as três obras se mostram absolutamente diferentes entre si. 
“A Vingança dos 47 Ronins” (fotos acima), de 1941, filmado durante a 2ª Guerra, tem direção do mestre Kenji Mizoguchi (“Contos da Lua Vaga”) e traz elementos comuns com o neo realismo italiano, que se iniciava naquela mesma época. “Os 47 Ronins”, (foto abaixo) de 1958, foi dirigido por Kunio Watanabe que era um especialista em aventuras de samurais, é mais curto e mais ágil, com um forte apelo ao entretenimento. 
Já “Os Vingadores” (foto abaixo) de Hiroshi Inagaki, com 4 horas de duração, é de 1962 e, curiosamente, tem uma pegada de docudrama (dramatização de fatos históricos) que começou naquele mesmo período, com influência do chamado "cinema verdade", sendo desenvolvido na BBC inglesa por Peter Watkins e, na RAI italiana, por Roberto Rosselini. Como vemos, cada uma dessas três obras reflete as linguagens audiovisuais que se manifestavam no mundo do cinema com um todo, tanto no lado ocidental quanto no Japão. Ao mesmo tempo, permite que se observem melhor as transformações e as permanências dos estilos e das técnicas, como na cenografia, figurinos e interpretação. Ou seja, assisti-las equivale a uma verdadeira aula de cinema.